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Decomposição e liberação de nutrientes da palhada de cana-de-açúcar em campo (página 2)

Alessandra Fabíola Bergamasco; Fábio Cesar da Silva; Luiz Henrique Antunes

 

No Estado de São Paulo, a massa de palhada de cana que permanece sobre o solo após o corte da cana varia de 13 a 20 t ha-1 de material seco (MS), sendo que a mineralização dessa massa vegetal é dependente de fatores ambientais como a temperatura, umidade, aeração e, principalmente, da composição química da palhada, especialmente da relação C/N, teores de lignina, celulose, hemicelulose e polifenóis (Ng Kee Kwong et al., 1987; Siqueira & Franco, 1988). Os restos culturais que apresentam teor de N menor que 18 g kg-1 e relação C/N maior que 20 imobilizam o N, e, como a palhada de cana possui, em média, 390 a 450 g kg-1 de carbono e 4,6 a 6,5 g kg-1 de N (Trivelin et al., 1995) esse resto cultural deve apresentar pequena mineralização líquida no período de um ano agrícola. Tem-se verificado maior taxa de decomposição nos carboidratos solúveis (sacarose e amido), seguidos dos carboidratos estruturais, hemicelulose, celulose e lignina, sendo este o mais refratário ao ataque microbiológico (Siqueira & Franco, 1988).

O presente trabalho teve por objetivo avaliar as perdas de C, a decomposição da hemicelulose, celulose e lignina, e a mineralização do N, P, K, Ca, Mg e S da palhada de cana-de-açúcar depositada sobre o solo após a colheita mecânica sem prévia despalha a fogo.

A decomposição da palhada de cana-de-açúcar, variedade SP 79-1011, foi avaliada em área comercial pertencente a Usina Santa Cruz OP, situada no município de Américo Brasiliense, SP. O solo dessa área comercial é um Latossolo Vermelho-Amarelo, textura média/argilosa, epieutrófico, que apresentou na camada de 0-25 cm: pH(CaCl2) de 5,3; CTC de 52,9 mmolc dm-3; V de 60%, e composição em areia e argila de 600 e 330 g kg-1, respectivamente.

Em agosto de 1996, em um talhão de cana de segundo corte, logo após a colheita mecânica e sem queima prévia do canavial, procedeu-se à amostragem da palhada, ao acaso, em unidades de 0,25 m2 (quatro repetições). A área do talhão utilizada para a amostragem não foi adubada na safra 1996-97. As amostras de palhada foram picadas e secadas a 65oC por 72 horas, em estufa de ventilação forçada, sendo posteriormente obtida a massa de material seco. Em subamostras do material da palhada seca em estufa, após ser passada em moinho tipo Willey, foram feitas as determinações de teores de C total por combustão a seco em analisador LECO CR-412, N total (Parkinson & Allen, 1975), P, K, C, Mg e S (Malavolta et al., 1989). Na determinação da hemicelulose, celulose, lignina e conteúdo celular usou-se a metodologia descrita por Silva (1990), descontando-se dos resultados a massa da cinza de amostras incineradas a 550oC, por seis horas.

Após um ano agrícola e antes de nova colheita da cana, na mesma área foi amostrada a palhada remanescente no solo. Na amostragem de agosto de 1997, a área de unidade amostral foi reduzida para 0,07 m2, mas aumentou-se o número de repetições para sete. Nessas amostras foram feitas as mesmas determinações químicas realizadas nas amostras de 1996.

Os valores médios mensais de temperatura (máxima e mínima) e de pluviometria, de agosto de 1996 a agosto de 1997, foram obtidos em estação meteorológica da Usina Santa Cruz OP, localizada próximo ao local de trabalho. A precipitação pluvial totalizou 1.733 mm, e as médias de temperaturas máximas e mínimas foram de 28,0 e 18,0oC, respectivamente, sendo de 3oC o desvio padrão para ambas as médias.

Os teores médios de C orgânico, hemicelulose, celulose, lignina, conteúdo celular, N total, P, K, Ca, Mg, S e relação C/N obtidos no material da palhada amostrada em 1996 e em 1997, foram submetidos à análise de variância, e as médias, comparadas pelo teste t a 5% de probabilidade.

Como a mineralização é fortemente influenciada pela temperatura e pela umidade da palhada, pode-se constatar que, mesmo nos meses mais quentes e de maior disponibilidade hídrica (setembro a março), a decomposição da palhada não foi limitada somente pela sua composição química; houve, ao menos, o efeito da temperatura na mineralização potencial desses restos culturais, uma vez que foi constatado em onze solos, incubados em temperaturas variando de 5 a 35oC, que a cada acréscimo de 10oC a taxa de mineralização praticamente dobrou (Stanford et al., 1973). A análise dos resultados mostra que houve diferença significativa para MS, K, Ca, Mg, C, conteúdo celular, hemicelulose e também para a relação C/N da palhada amostrada em 1996 e da palhada remanescente em 1997 (Tabela 1). A redução da massa de material seco foi aproximadamente de 22%, sendo originária principalmente dos decréscimos ocorridos nas quantidades de hemicelulose e conteúdo celular, o que confirma os relatos de Siqueira & Franco (1988). Dos carboidratos estruturais presentes na palhada de 1996, a hemicelulose e a celulose representavam, respectivamente, 37% e 53%; entretanto, na palhada remanescente a hemicelulose reduziu-se para 12%, e a celulose elevou-se para cerca de 74%.

 Em relação ao elemento K, houve liberação de 56 kg ha-1, o que correspondeu a um percentual de 85% do inicialmente existente na palhada. Essa grande liberação do K deveu-se ao fato de esse elemento não ser constituinte de nenhum composto existente na planta, e estar presente na forma iônica (Malavolta et al., 1989), o que facilita a sua saída da célula após o rompimento da membrana plasmática. Yaday et al. (1987) verificaram que a palhada de cana, incubada a 28oC, liberou 35% do K nos 15 primeiros dias de incubação, sendo que ao final do período experimental (120 dias), 70% de todo o K existente neste resto cultural havia sido liberado. A liberação do Ca e a do Mg atingiu percentuais de 44% e 39%, respectivamente, porque parte desses elementos está ligada a compostos iônicos e moleculares solúveis. Alta porcentagem do N e a totalidade do P e do S permaneceram na palhada remanescente.

Referências

MALAVOLTA, E.; VITTI, G.C.; OLIVEIRA, S.A. Avaliação do estado nutricional das plantas. Piracicaba: Associação Brasileira para Pesquisa da Potassa e do Fosfato, 1989. 201p.

NG KEE KWONG, K.F.; DEVILLE, J.; CAVALOT, P.C.; RIVIERE, V. Value of cane trash in nitrogen nutrition of sugarcane. Plant and Soil, v.102, p.79-83, 1987.

PARKINSON, J.A.; ALLEN, S.E. A wet oxidation procedure suitable for the determination of nitrogen and mineral nutrients in biological materials. Communication in Soil Science and Plant Analysis, v.6, p.1-11, 1975.

SILVA, D.J. Análise de alimentos (métodos químicos e biológicos). Viçosa: UFV, 1990. 165p.

SIQUEIRA, J.O.; FRANCO, A.A. Biotecnologia do solo: fundamentos e perspectivas. Brasília: MEC/ABEAS/ESAL/FAEPE, 1988. 236p.

STANFORD, G.; FRERE, M.H.; SHWANINGER, D.H. Temperature coefficient of soil nitrogen mineralization. Soil Science, v.115, p.321-323, 1973.

TRIVELIN, P.C.O.; BENDASSOLLI, J.A.; OLIVEIRA, M.W. Potencialidade da mistura de aquamônia com vinhaça na fertilização de canaviais colhidos sem despalha a fogo. Parte I: Estabilidade química da mistura. STAB -Açúcar, Álcool e Subprodutos, Piracicaba, v.16, n.2, p.26-29, 1997.

TRIVELIN, P.C.O.; VICTORIA, R.L; RODRIGUÊS, J.C.S. Aproveitamento por soqueira de cana-de-açúcar de final de safra do nitrogênio da aquamônia-15N e uréia-15N aplicado ao solo em complemento à vinhaça. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v.30, n.12, p.1375-1385, 1995.

WOOD, A.W. Management of crop residues following green harvesting of sugarcane in North Queensland. Soil & Tillage Research, v.20, p.69-85, 1991.

YADAY, D.V.; TODI, S.; SRIVASTAVA, A.K. Recycling of nutrients in trash with N for higher cane yield. Biological Wastes, v.20, p.133-141, 1987.

Mauro Wagner de Oliveira /2, Paulo Cesar Ocheuze Trivelin /3, Claudimir Pedro Penatti /4 e Marisa de Cássia Piccolo /5
pcotrive[arroba]cena.usp.br
2. Eng. Agr., M.Sc., aluno de Doutorado, Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA/USP), Caixa Postal 96, CEP 13400-970 Piracicaba, SP.
3. Eng. Agr., Dr., CENA/USP. Bolsista do CNPq.
4. Eng. Agr., M.Sc., Centro de Tecnologia Copersucar, Caixa Postal 162, CEP 13400-970 Piracicaba, SP.
5. Química, Dra, CENA/USP. Bolsista do CNPq.



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