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Crescimento e acúmulo de nitrogênio em cana-de-açúcar cultivada em solo coberto com palhada (página 2)

Alessandra Fabíola Bergamasco; Fábio Cesar da Silva; Luiz Henrique Antunes

 

Resultados e Discussão

Acúmulo de material vegetal e de N e estimativa da recuperação da uréia (15N) na soqueira de cana-de-açúcar

No período de 103 a 299 DAC, o tratamento T2 mostrou média geral maior que o T1 em todos os parâmetros avaliados (Tabela 1). Esses resultados, todavia, indicam a possibilidade de a soqueira de cana-de-açúcar, sem a presença de palhada na superfície do solo, apresentar maior produtividade nas condições experimentais do trabalho, embora em cada estádio de crescimento as médias e o erro-padrão não indiquem efeito dos tratamentos na produção de massa de material fresco, seco, do N total e do N na planta proveniente do fertilizante, na parte aérea da soqueira de cana-de-açúcar.

Em experimento conduzido por Aude et al. (1993), verificou-se que a cobertura do solo por palhada de cana-de-açúcar teve efeito negativo sobre a produtividade da cultura. Entretanto, efeito positivo da presença de palhada sobre a produtividade da cana-de-açúcar foi relatado por Wood (1991) em relação a solos com boa taxa de drenagem, ou em regiões com precipitação pluvial insuficiente ou irregular. Ball Coelho et al. (1993) observaram que a manutenção da palhada sobre o solo causou aumentos de 43% na produção de matéria seca da cana-de-açúcar.

As variações na produtividade da cana-de-açúcar em função da presença de cobertura do solo por palhada, verificadas na literatura, possivelmente estão relacionadas ao tempo de implantação do sistema sem queima, às condições termoídricas de cada região, à compactação do solo, e à variedade da cana-de-açúcar.

O acúmulo de N na parte aérea, nos dois tratamentos (Tabela 1), foi acompanhado por aumento de matéria seca até 169 DAC (março de 1998); posteriormente, decresceu ligeiramente no período de 204 a 237 DAC (abril a maio de 1998), e voltou a crescer entre 267 e 299 DAC (junho a julho de 1998) (Tabela 1). O acúmulo de matéria seca na parte aérea das plantas, no período posterior a 204 DAC, não se relacionou bem com o acúmulo de N, pois enquanto nesse período houve incremento da ordem de 25% de matéria seca, no N o aumento foi superior a 80%.

Trivelin et al. (1995, 1996) obtiveram resultados semelhantes aos deste experimento e levantaram a hipótese da translocação do N da parte aérea ao sistema radicular no começo da época de estiagem. Neste caso, em abril de 1998, a translocação provocaria o desenvolvimento do sistema radicular no período de 204 a 237 DAC. A emissão de novas raízes teria proporcionado maior exploração de volume de solo, aumentando, assim, o potencial de absorção e acúmulo de N do solo, observado no período de 267 a 299 DAC. Esse aumento na absorção de N mineral do solo, associado à menor volatilização do N pela parte aérea, poderiam ser os fatores que contribuíram para maior taxa de acúmulo de N nesse período. Com a diminuição da temperatura, ocorreria também redução nas perdas gasosas de N pela folhagem, à semelhança do observado por Stutte & Weiland (1978), levando, portanto, a maior acúmulo de N na parte aérea da planta.

Em todos os estádios de crescimento verificou-se que no tratamento T1, comparativamente a T2, houve tendência de menor acúmulo de N total, de N na planta derivado do fertilizante, e também na recuperação do N do fertilizante. Esses resultados poderiam ser atribuídos à maior imobilização microbiológica do N do fertilizante aplicado, por causa do aporte de palhada de elevada relação C:N (Vitti, 1998) e à maior volatilização do N, pois nesse tratamento não se incorporou a uréia no solo (Kiehl, 1989).

Análise quantitativa do crescimento da soqueira de cana-de-açúcar no ciclo de 299 dias

Utilizou-se a função logística para calcular o acúmulo de matéria seca da parte aérea da soqueira, em diferentes estádios de crescimento (Figura 1), que foram assim descritos:

Y = 28/(1 + (DAC/138,0693)-3,398) para o T1, R2 = 0,98, e Y = 32/(1 + (DAC/139,1216)-3,510) para o T2, R2 = 0,94.

A partir das equações anteriores, estimou-se a produção de matéria seca do vegetal, bem como os índices fisiológicos: taxa de crescimento relativo (TCR) e a taxa de produção de matéria seca (TPMS), segundo Lucchesi (1984), cujos resultados encontram-se na Figura 2. O acúmulo de matéria seca na parte aérea, nos dois tratamentos, apresentou uma forma sigmóide, característica de crescimento vegetal (Silveira, 1985), parecendo não haver influência positiva do resíduo vegetal adicionado ao solo. Tais resultados estão de acordo com os obtidos por Alvarez (1998), que não encontrou diferenças entre o crescimento de cana-de-açúcar com ou sem a presença de palhada, em dois ciclos vegetativos. Entretanto, por todo o período de crescimento monitorado, os valores médios foram constantemente maiores no tratamento T2.

Os valores de acúmulo de matéria seca total nos dois tratamentos representam as três fases do desenvolvimento do vegetal (Figura 1), definidas por Machado (1987). Verifica-se que a primeira fase de desenvolvimento foi de 0 a 60 DAC, e o crescimento nesta época foi lento, e a planta acumulou cerca de 6% da matéria seca total contida na parte aérea. A segunda fase de desenvolvimento ocorreu no período de 60 a 210 DAC, quando a parte aérea da planta apresentou elevada taxa de crescimento, e acumulou, neste intervalo, 81% da matéria seca. A terceira fase, caracterizada como fase de maturação, ocorreu de 210 a 299 DAC, quando o acúmulo de matéria seca foi, em média, de 13%.

A TPMS apresentou uma curva com formato de sino, nos dois tratamentos, foi baixa no início do ciclo, e aumentou rapidamente, até atingir um valor máximo, para, em seguida, decrescer (Figura 2).

Nos dois tratamentos, a máxima TPMS ocorreu aos 137 DAC (fevereiro). No tratamento T2, a TPMS máxima foi de 22,4 g m-2 dia-1 , e a média, de 11 g m-2 dia-1, enquanto no T1 a TPMS máxima foi de 18,5 g m-2 dia-1 , e a média, de 7 g m-2 dia-1. Estes resultados são semelhantes aos obtidos por Machado et al. (1982), que obtiveram TPMS máxima de 25 g m-2 dia-1, e média de 12 g m-2 dia-1 .

A variação da taxa relativa de crescimento (TCR) no tempo é representada por uma função exponencial negativa (Figura 2), com valor máximo nos dois tratamentos aos 43 DAC (novembro de 1997), decrescendo com o tempo e estabilizando-se aos 210 DAC (abril de 1998), no início da época de maturação. A TCR máxima durante o período de monitoramento foi de 0,137 e 0,135 g g-1 dia-1 no T2 e no T1, respectivamente. A TCR média foi de 0,0288 g g-1 dia-1 no tratamento T2 e 0,0279 g g-1 dia-1 no T1, sendo portanto semelhantes.

Verifica-se que em ambos os tratamentos (Figura 2) a TCR diminuiu à medida que a planta cresceu, devido, dentre outros fatores, ao aumento de competição intraespecífica pelos principais fatores ambientais responsáveis pelo crescimento vegetal, tais como: luz, nutrientes, difusão de CO2 dentro do stand.

Recuperação do N da uréia (15N) na parte aérea da soqueira de cana-de-açúcar na colheita final

Os resultados dos tratamentos que receberam a uréia com N marcado não se mostraram diferentes pela análise da variância (Tabela 2). Entretanto, existiu tendência de menor recuperação do 15N quando se aplicou a mistura vinhaça e fertilizante sobre o solo em área total. As possíveis explicações para essa tendência de menor aproveitamento do N do fertilizante no tratamento T1 são: (a) o efeito da localização da fonte nitrogenada; a aplicação do fertilizante aplicado próximo ao sistema radicular da cultura em T2 apresentou maior eficiência de aproveitamento, se comparada à aplicação em área total; (b) o N aplicado permaneceu temporariamente imobilizado na biomassa microbiana, devido à maior atividade dos microrganismos quimiorganotróficos no T1 (Siqueira & Franco, 1988), fato este que também proporcionou menor aproveitamento do N do fertilizante; c) a maior volatilização do N da uréia quando essa é aplicada sem ser incorporada no solo (Kiehl, 1989).

A quantidade do N da uréia presente na parte aérea da cana-de-açúcar representou, em média, 14 e 22 kg ha-1, valores estes que corresponderam a uma eficiência de utilização do fertilizante de cerca de 14 e 22% do N do fertilizante aplicado em diferentes formas no solo, respectivamente no T1 e T2.

Os valores de recuperação ou de eficiência de utilização do fertilizante (R) são semelhantes aos obtidos por Takahashi (1967) em relação às diferentes condições climáticas a que foi submetida a cultura (R = 27 a 12%). Por outro lado, esses valores de eficiência de recuperação do fertilizante podem ser considerados baixos, se comparados com os de Trivelin et al. (1995), que obtiveram valores de aproximadamente 40%, porém usando outra variedade de cana-de-açúcar em outro solo.

O N na planta proveniente do fertilizante (NPPF) representou, respectivamente, 10 e 16% do total acumulado na parte aérea na soqueira de cana-de-açúcar no T1 e T2. Estes valores mostraram-se concordantes com os de 12% obtidos por Carnaúba (1989), e aos de Trivelin et al. (1995, 1996), que observaram valores de 12 a 14% do N total acumulado na parte aérea da soqueira de cana-de-açúcar. É importante ressaltar que todos os trabalhos mencionados foram conduzidos em condições de manejo convencional, ou seja, sem a presença da cobertura do solo por palhada.

Com base nos resultados da literatura e nos deste trabalho, pode-se afirmar que, em condições variadas de solo, clima e variedade de cana-de-açúcar, o N na planta proveniente do fertilizante (NPPF) representa uma pequena fração do N total acumulado na parte aérea da cultura. Assim, pode-se inferir que as principais fontes de N para a cana-de-açúcar são a mineralização da matéria orgânica nativa do solo e de resíduos vegetais (Ng Kee Kwong et al., 1987; Chapman et al., 1992; Sampaio et al., 1995; Vitti, 1998), e a fixação biológica do N atmosférico por microrganismo (Lima et al., 1987; Urquiaga et al., 1992). Devem-se mencionar os efeitos que ocorrem no solo associados ao N do fertilizante, quando em presença de matéria orgânica fresca, como a pool substitution e priming effect que levaram Jenkinson et al. (1985) a propor o conceito do ANI (interação no solo do N mineral adicionado). Em condições como as deste trabalho, pode ocorrer uma subestimativa na recuperação do N do fertilizante pela técnica com 15N, e, como conseqüência, o aproveitamento do N de outras fontes é superestimado.

Conclusões

1. O acúmulo de massa de material seco e de N total nos diferentes estádios de crescimento e na colheita final da soqueira de cana-de-açúcar não são alterados pela cobertura da superfície do solo por palhada.

2. A palhada de cana-de-açúcar não altera a eficiência de utilização do N da uréia pela soqueira.

Agradecimentos

À Fapesp, pelo apoio financeiro; à Copersucar e à Usina Iracema S/A, pelo apoio logístico.

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Glauber José de Castro Gava(2), Paulo Cesar Ocheuze Trivelin(3), Mauro Wagner de Oliveira(4) e Claudimir Pedro Penatti(5)
pcotrive[arroba]cena.usp.br

(2) Universidade de São Paulo (USP), Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), Lab. de Isótopos Estáveis, Caixa Postal 96, CEP 13400-970 Piracicaba, SP. Bolsista da Fapesp. Email: ggava[arroba]cena.usp.br
(3) USP, Cena, Lab. de Isótopos Estáveis. Bolsista do CNPq. Email:
pcotrive[arroba]cena.usp.br
(4) Universidade Federal de Viçosa, Caixa Postal 342, CEP 35430-970 Ponte Nova, MG. Email:
mwagner[arroba]mail.ufv.br
(5) Copersucar, Centro de Tecnologia Copersucar, Dep. de Solos, Caixa Postal 162, CEP 13400-870 Piracicaba, SP. Email:
claudimir[arroba]copersucar.com.br



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