O Conflito Negativo de Atribuições e a Independência Funcional Do Promotor De Justiça



 

Como é sabido, antes de se iniciar a ação penal, com o oferecimento da denúncia, não se pode falar em conflito de competência ou de jurisdição, mas, tãosomente, em conflito de atribuições entre membros do Ministério Público a ser dirimido pelo Procurador- Geral de Justiça (ou da República, conforme o caso).

Aliás, pouco importa que tenha o Juiz de Direito exarado nos autos da peça informativa qualquer despacho neste ou naquele sentido, pois, nesta primeira fase da persecutio criminis não há falar-se em competência e sim em atribuição do Promotor de Justiça (ou Procurador da República).

Com efeito, o que diferencia o conflito de atribuição do conflito de jurisdição ou competência não são exatamente as autoridades em confronto, mas o tipo de ato a ser praticado. Assim, o fato de dois Juízes declararem em seus respectivos despachos não serem competentes para determinado feito, não implica necessariamente que tenha surgido entre eles um conflito negativo de jurisdição ou competência, pois o que importa para a perfeita identificação do problema é visualizarmos em cada caso concreto qual a natureza do ato a ser praticado e não a autoridade que o venha a praticar.

Ora, quando se está diante de um inquérito policial não há, ainda, evidentemente, processo instaurado, sequer ação penal iniciada.

Nestas condições, os despachos exarados em um procedimento investigatório se revestem de caráter eminentemente administrativo (salvo as medidas de natureza cautelar), não podendo ser considerados atos jurisdicionais, nem gerar, por conseguinte, qualquer vinculação do ponto de vista da competência processual.

Aliás, admitindo-se o contrário estaria ferida de morte a autonomia dos membros do Ministério Público, pois a atribuição ministerial seria ditada pelo despacho do Juiz oficiante, o que é inconcebível em nosso sistema processual penal, estruturalmente acusatório, no qual estão perfeitamente definidas as funções de acusar, de defender e de julgar, sendo vedado ao Juiz proceder como órgão persecutório.

Pelo sistema proíbe-se "al órgano decisor realizar las funciones de la parte acusadora"2, "que aqui surge com autonomia e sem qualquer relacionamento com a autoridade encarregue do julgamento"3.

Dos doutrinadores pátrios, talvez o que melhor traduziu o conceito do sistema acusatório tenha sido o mais completo processualista brasileiro, José Frederico Marques:

"A titularidade da pretensão punitiva pertence ao Estado, representado pelo Ministério Público, e não ao juiz, órgão estatal tão-somente da aplicação imparcial da lei para dirimir os conflitos entre o jus puniendi e a liberdade do réu.

"Não há, em nosso processo penal, a figura do juiz inquisitivo.

Separadas estão, no Direito pátrio, a função de acusar e a função jurisdicional. (...) O juiz exerce o poder de julgar e as funções inerentes à atividade jurisdicional: atribuições persecutórias, ele as tem muito restritas, e assim mesmo confinadas ao campo da notitia criminis. No que tange com a ação penal e à função de acusar, sua atividade é praticamente nula, visto que ambas foram adjudicadas ao Ministério Público."4

 


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