Comunicação cartográfica com a utilização do philcarto: Um estudo do acesso do lazer em londrina (página 2)

Para realização deste trabalho fez se necessário à criação de um banco de dados próprio, contendo variáveis que facilitaram a analise da questão proposta neste estudo. Buscando informações para melhor caracterizar o quadro social relacionando a localização dos clubes com a concentração de renda e a distribuição populacional.

Para localizar os clubes e associações utilizamos como base, a lista telefônica (Editel-2003), onde posteriormente foi feita a localização dentro dos setores da base cartográfica definidos a partir dos dados censitários (IBGE). Para o levantamento das variáveis de população e renda no município de Londrina, a fonte dos dados foi o censo do IBGE de 2000, trabalhando esses dados, através de tabelas, construídas no programa Excel, sendo construída uma coluna para cada tipo de informação, fazendo o cruzamento dos dados a cada polígono ou ponto produzido no mapa, esta foi associada ao número identificador do setor que compõe a tabela e sua concentração relativa ao número de clubes, população e renda. Com as tabelas concluídas, foram utilizadas como fonte de dados para produção de mapas, utilizando o software Philcarto, que é um programa de cartografia temática desenvolvido na França pelo geógrafo Philippe Waniez (2002). Este é disponibilizado gratuitamente pela Internet, e consiste em um software didático por ser de fácil manuseio. Para a elaboração de cartogramas necessita-se anteriormente de trabalhar com os outros dois softwares, no caso o Microsoft Excel® e o Adobe Ilustrator®, sendo que no primeiro se constrói a base de dados, e no segundo a base cartográfica necessária para o desenvolvimento do trabalho. Utilizamos para representar a concentração da população, o mapa nuvens de pontos, esse modelo é utilizado também para representar quantidades, pois através da presença desses pontos dentro da unidade espacial, um maior número desses pontos caracterizam uma maior densidade populacional. Para demonstrar os dados de concentração dos clubes e de renda, foi utilizado o mapa de círculos proporcionais sobreposto ao coroplético, esse modelo permite o trabalho com duas variáveis em um mesmo mapa, uma representada pela cor dos polígonos e outra pelo circulo proporcional.O processo utilizado também no caso da variável renda em contraste com a localização dos clubes. Fazendo o uso desses recursos, pode-se produzir um mapa para ver, não exaustivo, evitando o excesso de informação. Segundo Martinelli (1990) sobrepor várias informações em um único mapa não proporciona uma visão instantânea e global do conjunto, e nem mesmo, responde visualmente a pergunta mais solicitada: Onde está tal atributo variável?

A cidade de Londrina surgiu no processo de expansão das frentes pioneiras do norte do Paraná no início dos anos de 1930 e foi planejada para uma população de 20 mil habitantes, atualmente ultrapassa os 400 mil, conforme censo IBGE, assumindo dimensões e aspectos que justificam a elaboração de muitas pesquisas. A partir dos anos de 1980, o processo de verticalização na região central da cidade, foi intensificado, aumentando a atuação das construtoras que buscaram atender uma demanda crescente do mercado. Fato que proporcionou a concentração de pessoas com alto poder aquisitivo, nas proximidades dos clubes já existentes nesta região. Os novos projetos, implementados mais recentemente, localizados na região sudoeste da cidade (gleba Palhano, por exemplo) além dos espaços destinados à moradia, dá ênfase às áreas verdes, aos espaços comunitários, às quadras de esportes, piscinas, churrasqueiras e áreas de recreação infantil, valorizando assim, a unidade habitacional, em função do aproveitamento do espaço e da própria estrutura de lazer, serviços e segurança. Por outro lado, a região norte da cidade, surgiu nos anos de 1970^, através da construção de conjuntos habitacionais, distantes da região central, imprimiram uma conformação física, social e econômica ao espaço urbano de Londrina, totalmente diferenciada, com amplos vazios urbanos. Nesta região, não foram feitos investimentos na área de lazer. A partir de uma análise histórica do processo de urbanização, como coloca Barros (1998), entendemos que a estruturação da cidade de Londrina, partiu da região da avenida Higienópolis e avenida JK, na porção central da cidade, justificando os investimentos privados nessa região. A infra-estrutura de lazer foi implementada através da construção de clubes, localizados na região, para atender uma classe com alto poder aquisitivo, aí concentrada. Reafirmando que a estrutura social atual da cidade, contribui para a atual distribuição e infra-estrutura do lazer existente.

O Lago Igapó é uma da áreas de lazer da cidade. Foi projetado em 1957, como uma solução para um problema da drenagem do ribeirão Cambezinho, dificultada por uma barragem natural. Nos anos de 1990, após um período de certo abandono, foi elaborado um projeto de revitalização do Lago e construídos o Zerão (Área de Lazer Luigi Borguesi). A revitalização transformou o lago em uma das mais belas áreas de lazer e embelezamento paisagístico e o cartão postal da cidade. Sua implantação possibilitou a valorização da região centro-sul da cidade. Podemos dizer que o lago Igapó é o "espelho" que reflete a falta de infra-estrutura de lazer que atinge todas as demais regiões da cidade, uma vez que a maior parte desta se concentra nas áreas centrais. O Lago Igapó, nos finais de semana, acolhe toda essa população, que muitas vezes enfrentam dificuldades para se deslocar. Um dos fatores de restrição de acesso dos moradores aos clubes da região central é o valor das ação e das mensalidades que são pagas para o uso dos clubes. Através de um levantamento realizado no início de 2004, constatamos que o valor das ações dos clubes varia entre R$700 e R$10.500 reais, e as mensalidades, entre R$80 e R$110 reais. Outro limitante é a capacidade de associados estabelecida pelos clubes. Na maior parte dos casos, uma ação só poderá ser negociada pelo clube, no caso de inadimplência registrada ou pela venda direta feita pelo próprio sócio. Assim, as restrições existentes, podem ser de nível econômico, pelo valor das ações e manutenção e através da disponibilidade de ações existentes para a venda, limitando o número de associados, como mostra a tabela 1 a seguir:

Tabela 1.
Fração mensal da renda da população, por região da cidade e valor médio das mensalidades
Fonte: Elaborado a partir dos dados do censo demográfico, 2000 e pesquisa de campo.

Os valores de renda mensal evidenciam a desigualdade existente entre as regiões da cidade, a dificuldade das pessoas de baixa renda é visível, o valor médio de uma mensalidade eqüivaleria a mais da metade da renda média mensal, como se observa na região sul, impossibilitando o acesso a esse tipo de lazer - utilização de piscinas e saunas, por exemplo, equipamentos que dependem de maiores investimentos. A restrição imposta a esta população (que vive com um ou alguns salários mínimos), permite como alternativas de lazer, as áreas públicas da cidade, que são poucas: Zerão, Lago Igapó, ou os clubes "populares", como é o caso do Thermas de Londrina.

A necessidade de piscinas na cidade também pode ser justificada, quando verificamos algumas das características naturais. A cidade apresenta temperatura média elevadas. Nos meses mais quentes do ano (dezembro, janeiro e fevereiro), a média fica em torno de 28ºC, segundo dados do Instituto Agronômico do Paraná - IAPAR. Este fator também poderia ser levado em consideração para os novos projetos futuros, mais propriamente, construção de locais que tenham boa infra-estrutura de lazer, que contenham piscinas e outros acessórios disponíveis a toda população.

A construção do mapa demográfico de Londrina torna visível uma maior concentração populacional na região central, confirmando assim as teorias que caracterizam este centro, nesta mesma região existe uma maior concentração dos clubes de alto padrão, voltados para uma classe que possui maior poder aquisitivo; são também os clubes mais antigos e tradicionais da cidade, na tabela 2 a seguir pode ser observado o percentual de clubes nas regiões:

Tabela 2.
Clubes em Londrina
Fonte: Pesquisa de campo, realizada em 2003.

No centro, estes clubes representam 63,5% do total de clubes existentes na cidade caracterizando a alta concentração na região, justificando assim todas as considerações anteriores. Ainda dentro da região central localizamos uma maior concentração de renda o que justificaria a grande quantidade de clubes para oferecer esse serviço de lazer, para essa população. A região norte possui apenas 14,6% do total de clubes da cidade, deixando claro a falta de investimentos de lazer, que procuram oferecer a população os mesmos serviços encontrados na região central. Em contrapartida, fica claro que há uma concentração populacional elevada, 19,4% e um número muito baixo de clubes. Analisando o nível de renda média mensal percapta, em torno de R$ 155, 51, verificamos que o baixo poder aquisitivo dos moradores também acaba limitando o acesso tanto à estrutura já existente, quanto aos novos investimentos. A região sul detém 21,9% dos clubes da cidade, concentrando 10,1% da população.

A Gleba Palhano localizada na região sudoeste da cidade carece de uma analise particular, pois só ela reponde por 12% do total de clubes da cidade, aqui verificamos uma densidade relativamente baixa cerca de 0,07% da população. Apesar disso, concentra-se na mesma região um grande número de clubes, mas esses moradores não possuem relação com o nível sócio econômico dos freqüentadores uma vez que residem em condomínios de alto padrão que oferecem toda a infra-estrutura e lazer (realidade presente hoje). Os seus freqüentadores seriam funcionários que utilizam um serviço que a empresa na qual estão vinculados, oferece, Nesta região concentra-se a maior parte de clubes e associações de funcionários.

A localização desses clubes nesta região pode ser explicada pelo valor do terreno, uma região de chácaras, até os anos de 1980, antes da construção do shopping center e dos atuais condomínios de alto padrão, possibilitando um custo menor para implantação. Através dos mapas de concentração de renda, população e clubes, podemos constatar que a concentração dos clubes é mais um reflexo que evidencia a concentração de renda no município de Londrina.

A análise dos mapas e a observação dos dados levantados indicaram que o acesso aos clubes e associações na cidade de Londrina é restrito a população em geral, e que o acesso ao lazer em Londrina, proporcionado pelos clubes e associações podem ser caracterizados em três níveis: O primeiro é constituído por pessoas ligadas a uma associação, através de empresas a qual estejam vinculadas por motivos profissionais, na maior parte dos casos; o segundo é formado por pessoas que possuem condições financeiras para manterem-se associados em um clube particular; e o terceiro, a maior parte, fruto de uma exclusão social, que não tem acesso a esse tipo de lazer, tendo a opção de um ou outro clube público, ou de ir a um clube popular, ao ainda, o Lago Igapó e o Zerão. A tabela 3, a seguir, indica os níveis de renda da população, enfatizando a desigualdade no acesso ao lazer na cidade. Analisando bairros de regiões distintas, os níveis populacionais justificariam a necessidade desse serviço, já os níveis de renda que são tão desiguais colocam em evidencia o fato de que quem na verdade necessitaria de novos investimentos neste setor seria a população que mora na periferia e que percebe baixos salários.

Tabela 3.
Demonstrativo do equivalente de renda, população e clubes por bairros e região.
Fonte: IBGE, 2000 e pesquisa de campo - 2003.

Os níveis de renda foram utilizados como fator concreto para o melhor entendimento. Analisando bairros de regiões distintas, os níveis populacionais justificariam a necessidade desse serviço, já que as rendas são tão desiguais e colocam em evidencia o fato de que quem na verdade necessitaria desse serviço é a população cuja fração corresponde à cerca de metade dos seus rendimentos mensais. A existência e o acesso a esses equipamentos de lazer seria mais um fator que comprovaria a "Fragmentação do espaço urbano" como escreve Silva (2001), já que muitas vezes estes estão localizados em regiões que podem ser claramente diferenciadas através do padrão de vida e dos seus rendimentos. Esta "Fragmentação" pode ser compreendida levando em consideração também à distribuição populacional, os próprios equipamentos de lazer e o nível de renda dos bairros analisados, como foram demonstrados acima. Com este trabalho procuramos demonstrar que em Londrina existe uma disparidade muito grande quanto ao acesso a esse tipo de lazer (clubes e associações). Há uma população que possui várias opções de entretenimento e outra que não possui "nada". Quanto à existência e localização desses clubes em cada região, podemos adiantar que na periferia ela está ligada à forma desordenada e rápida do processo de urbanização, enquanto que no centro, se deve a própria estruturação da cidade de Londrina, partindo das regiões centrais, que coincidem com os locais onde se concentram os clubes de alto poder aquisitivo. Reafirmando que a estrutura urbana desenvolvida na cidade, contribui para a atual distribuição e infra-estrutura do lazer existente. Através da utilização da cartografia temática, pudemos visualizar esta realidade existente na cidade, e mesmo, mapear regiões que apresentam necessidade de investimentos futuros, relacionados às atividades de lazer para toda a população.

• BARROS, Mirian Vizintim Fernandes. Análise ambiental urbana; estudo. aplicado à cidade de Londrina – PR. 1998. Tese (Doutorado em Geografia Física) – Universidade de São Paulo, São Paulo.
• BIANCHI, Bene. Igapó muda perfil imobiliário da zona sul. Folha de Londrina, Londrina, 26 mai. 2002. Reportagem local, p.13.
• SILVA,William R. Fragmentação do espaço urbano de Londrina.Geografia, Londrina, jan./jun. 2001.
• FERREIRA,Yoshiya N. Bolsões de pobreza de Londrina.Geografia, Londrina, jan./jun. 1999.
• MARTINELLI,Marcello. Orientação semiológica para as representações da geografia: mapas e diagramas.São Paulo-SP,1990.
• BONIN,Serge. Novas perspectivas para o ensino da geografia.Boletim Goiano de Geografia, Goiânia, Jan., 1982.
• INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo demográfico.Rio de Janeiro:IBGE, 2000.
• EDITEL.Lista telefônica.Londrina-PR,2003.