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4. Material e métodos

O estudo foi conduzido na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo, no Campus de Pirassununga. Foram utilizados 25 cordeiros machos da raça Santa Inês com peso médio de 26,5kg e idade média de 150 dias. Os animais foram alocados em gaiolas de estudo de metabolismo, equipadas com bebedouro automático, cocho e coletor de urina. Os ovinos foram alimentados com dieta calculada para suprir suas necessidades, segundo o NRC (1985). Foram oferecidos cinco tratamentos, diferindo nas concentrações de bicarbonato de sódio, sulfato de amônio e caulim em 5 níveis de BCAD (-160; -40; 140; 260; 500mEq/kg de MS). O tratamento com 140mEq/kg de MS foi considerado o controle, uma vez que continha os níveis de Na+; K++; Cl- e S-2 preconizados pelo NRC (1985) para ovinos. A tabela 1 apresenta a composição químico-bromatológicas das dietas experimentais.

O experimento teve duração de 90 dias, sendo os 15 primeiros correspondentes ao período de adaptação à ração total. Para a realização do balanço mineral, foram coletadas amostras de fezes e da dieta na proporção de 10%. A urina foi amostrada na proporção de 5%. O período de coleta teve duração de cinco dias, e foi realizado do 25° ao 30° dia e posteriormente entre o 55° e o 60° dia.

As determinações de matéria seca e matéria mineral para fezes e rações obedeceram às recomendações da AOAC (1990). O cálcio foi determinado por espectrofotometria de absorção atômica (equipamento Perkin Elmer), através de diluições e adição de 1% de Lantânio (10N). O sódio foi determinado através de fotômetro de chama. O enxofre foi determinado por turbidimetria em sistema ‘’Flow Injection Analysis". O cloro foi determinado através de titulometria com nitrato de prata. As urinas, armazenadas individualmente, foram homogeneizadas, alocadas em garrafas plásticas e posteriormente acidificadas até atingirem pH entre 1 e 2. As análises de cálcio e sódio seguiram as metodologias apresentadas anteriormente para as rações e fezes. Os níveis de cálcio total e ionizado no soro foram analisados através de "Kit´s" da marca LABORLAB. Para a análise do cálcio ionizado, foram utilizados 3 tipos de Kit´s. O primeiro foi utulizado para a determinação da quantidade de albumina presente no soro; o segundo, para a determinação da proteína total, e o terceiro, para a determinação do cálcio total. Esses valores foram equacionados para a determinação do cálcio ionizado.

O delineamento experimental foi em blocos, para controlar o efeito do peso inicial dos animais, sendo que foram utilizados 25 animais com cinco repetições por tratamento, cinco tratamentos e cinco blocos. Os dados obtidos foram analisados por meio do procedimento GLM do programa computacional SAS (SAS Institute Inc., 1988), sendo realizada análise de regressão (linear quadrática e cúbica) nos níveis do BCAD (-160, -40, 140, 250 e 500mEq/kg de MS). Foram realizados contrastes ortogonais entre os tratamentos N1(-160 mEq/kg de MS), N2 (-40mEq/kg de MS), C (140mEq/kg de MS), P1 (+250mEq/kg de MS) e P2 (+500 mEq/kg de MS), e também entre os tratamentos negativos (N1 e N2), o controle (C) e os positivos (P1 e P2), foi considerado o nível de significância de 5% para todos os dados analisados. Os contrastes foram usados para uma comparação mais ampla entre os tratamentos de forma a esclarecer o efeito do BCAD nas variáveis usadas.

5. Resultados e discussão

Os resultados dos balanços de cálcio estão apresentados nas tabelas 2 e 3. Pela tabela 2, observa-se que o único efeito foi na excreção urinária de cálcio, a qual aumentou de forma linear com a diminuição do BCAD. A tabela 3 revela que, após cinqüenta e cinco dias de oferecimento das dietas iônicas, o comportamento do balanço de cálcio se alterou. A absorção aparente de cálcio apresentou efeito cúbico significativo, sendo que o mesmo comportamento foi observado para a retenção desse macromineral. A excreção urinária de cálcio apresentou comportamento quadrático, e foi sempre maior para os tratamentos negativos (N1 e N2).

Existe muita controvérsia na literatura, quanto aos efeitos do BCAD na absorção de cálcio. O presente experimento não encontrou efeito do BCAD na absorção de cálcio no primeiro balanço, porém encontrou efeito cúbico significativo no segundo balanço, o que pode ter acontecido por uma mudança no metabolismo de cálcio em função do tempo de oferecimento das dietas iônicas.

LECLERC & BLOCK (1989) e DEL CLARO et al. (2002) não encontraram alterações na absorção intestinal com uso de dietas aniônicas ou catiônicas em ruminantes. SCHONEWILL et al. (1994) encontraram maior absorção aparente de cálcio com dietas aniônicas. LOMBA et al. (1978) afirmaram que a maior absorção se dá pela natureza acidogênica dos ânions no intestino, que aumenta a solubilização do cálcio. Para BLOCK (1994), não existe um mecanismo claro de influência do BCAD na absorção intestinal de cálcio, o que explica a divergência de resultados na literatura. Em geral, os resultados encontrados no primeiro balanço do presente experimento têm uma maior prevalência na literatura, o que pode acontecer pelo tempo de oferecimento das dietas iônicas, uma vez que a maior parte dos experimentos são feitos com vacas no pré-parto e oferecimento de dietas aniônicas por cerca de um mês.

Segundo MACkDOWELL (1992), as fezes são a principal via de excreção do cálcio, sendo o cálcio das fezes resultado do cálcio não absorvido da dieta, cálcio endógeno não absorvido e da secreção intestinal desse elemento. O efeito cúbico encontrado no segundo balanço pode ter sido em função de uma secreção intestinal de cálcio, o que dificulta a interpretação desses resultados.

Quanto à excreção urinária, no primeiro balanço, foi encontrado efeito linear significativo. No segundo balanço experimental, o efeito observado foi quadrático. Nos dois balanços, foram encontrados aumento da excreção urinária de cálcio com a queda do BCAD. Os resultados concordam com os relatados por VAGNONI e OETZEL (1998), SETTI (2001) e DEL CLARO et al. (2002). SCHONEWILLIE et al. (1999) afirmaram que a excreção urinária de cálcio foi seis vezes maior nas vacas com tratamento aniônico, do que naquelas com tratamento catiônico. VAN MOSEL et al. (1993) afirmaram que vacas alimentadas com dieta aniônica excretam de 10 a 30 vezes mais cálcio que vacas alimentadas com dieta catiônica. DELAQUIS & BLOCK (1995) não encontraram diferenças na excreção urinária de cálcio com a diminuição do BCAD provavelmente em função da pouca diferença entre os dois tratamentos (258,1 e 55,5mEq/kg de MS). GOMIDE et al. (2004), em trabalho com ovinos, também não encontraram aumento de excreção de cálcio na urina com uso de dieta aniônica, provavelmente por ela ser pouco negativa (-12mEq/kg de MS).

O aumento da excreção urinária, segundo BLOCK (1984), é uma conseqüência secundária do aumento sanguíneo em função da mobilização óssea. Com esse aumento da excreção de cálcio, ocorreria um aumento da formação de 1,25(OH) que estimularia a mobilização óssea e aumento sanguíneo de cálcio. Outro mecanismo seria em função da produção renal de 1,25(OH)2D3, a qual poderia ser influenciada pelo baixo pH intracelular (BLOCK,1994).

A excreção de cálcio da dieta é predominantemente feita pelas fezes. Dessa forma, a alteração da excreção urinária do cálcio não foi suficiente para influenciar a retenção desse macromineral. Não houve influência do BCAD na retenção de cálcio no primeiro balanço e foram encontrados efeitos cúbicos significativos do BCAD no segundo balanço, provavelmente em função da secreção intestinal de cálcio.

Os resultados apresentados concordam com os encontrados por TAKAGI & BLOCK (1991) os quais relataram absorção aparente similar entre os tratamentos e aumento de excreção urinária não suficiente para alterar a retenção de cálcio. FREDEEN et al. (1988), em experimento conduzido com vacas no pré-parto, não observaram alteração na excreção fecal de cálcio em função do decréscimo do BCAD. No entanto, diferenças no balanço de cálcio não foram relatadas pelos autores, tanto para as vacas em produção, como para as em pré-parto. Para as vacas em pré-parto, a excreção urinária de cálcio aumentou de 0,59 para 7,6% do total de cálcio consumido. WILSON et al. (1998), trabalhando com cordeiros obtiveram um acréscimo no cálcio excretado de 0,11g /dia na dieta controle para 0,75g/dia na dieta aniônica. A absorção aparente desse mineral não se alterou, ou seja, o decréscimo no BCAD foi suficiente para alterar a excreção urinária, sem afetar o balanço de cálcio, assim como no presente experimento. Dessa forma, o BCAD parece não ter influência direta sobre a absorção intestinal de cálcio, contudo tem efeito sobre a excreção urinária, a qual aumenta com o decréscimo do BCAD. Esse efeito, apesar de efetivo, não é suficiente para influenciar a retenção de cálcio.

A tabela 4 apresenta os níveis do cálcio total e ionizado (mg por dL) durante o experimento. Observa-se que, para o cálcio total, no 15° e 60° dia, houve um efeito linear significativo, ou seja, com o decréscimo do BCAD, houve um aumento dos níveis séricos de cálcio total. No 30° dia, apesar do efeito cúbico, os tratamentos negativos apresentaram maiores concentrações de cálcio que os positivos e o controle. De maneira geral, tanto na forma ionizada como na total, a concentração de cálcio foi superior nos tratamentos N1 e N2. Para o cálcio ionizado, a análise de contrastes revelou que as dietas negativas (N1 e N2) foram superiores às positivas (P1 e P2) e a controle.

Do cálcio total (mg/dL) encontrado no sangue, 45 a 50% estão na forma solúvel, ou seja, ionizada. Cerca de 40 a 45% estão ligados à proteína, os outros 5% formam complexos com elementos inorgânicos de acordo com o pH do sangue (CUNNINGHAM ,1999). Os maiores níveis encontrados nos tratamentos com inclusão de sal aniônico em ovinos machos concordam com os relatados por TAKAGI & BLOCK (1991).

BLOCK (1984), trabalhando com níveis de +330,5 e -128,5mEq por kg de MS, observou uma maior concentração plasmática de cálcio no BCAD negativo, segundo o autor resultado de um aumento na mobilização óssea. LECLERC & BLOCK (1989) concluíram que a alimentação com BCAD negativo durante o pré-parto reduz o declínio natural da concentração de Ca. Esse resultado, segundo os autores, ocorre de efeito indireto da acidose metabólica, afetando a reabsorção renal de cálcio e a mobilização óssea desse macromineral.

DEL CLARO et al. (2002) observaram aumento no nível de cálcio total no soro 19 dias após o oferecimento de dieta aniônica (-150mEq/kg). VAGNONI & OETZEL (1998) trabalharam com vacas secas e BCAD de 203;-51;-40 e -63mEq (Na+K) –(Cl+S)/ kg de MS e não encontraram alterações nos níveis de cálcio total e ionizado entre os períodos em que as vacas foram submetidas ao tratamento de 203mEq/ kg de MS em relação aos tratamentos com sais aniônicos. A adição de bicarbonato de sódio na ração de vacas não promoveu nenhuma variação na concentração sérica do cálcio (TUCKER et al., 1991). FAUCHON et al. (1995), em experimento com ovinos em crescimento, com tratamentos de 4, 175, 390 e 580mEq (Na + K) – (Cl+S) /kg de MS não encontraram diferenças na concentração de cálcio plasmático, entretanto os autores afirmaram que os animais desse experimento não estavam sob condições de acidose, a qual iria propiciar a reabsorção óssea. GOFF et al. (1991) mostraram que a redução do BCAD aumentou a produção de 1,25(OH)2D3 por unidade de PTH. Então, a acidose metabólica proporcionada pelo BCAD negativo estimula a transformação de 25(OH) colicalciferol em 1,25(OH)2D3, a qual aumenta a reabsorção óssea liberando cálcio para a corrente sangüínea, o que pode explicar em parte, os resultados do presente estudo.

6. Conclusões

O BCAD influencia o metabolismo de cálcio em ovinos machos. A redução do BCAD aumenta a excreção urinária de cálcio, entretanto, não altera a retenção desse macromineral. A concentração sanguínea de cálcio aumenta com a diminuição do BCAD 15 dias após o início da suplementação com sulfato de amônia.

7. Referências

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Gustavo Ribeiro Del ClaroI; Marcus Antonio ZanettiII; Lisia Bertonha CorreaII; Arlindo Saran NettoII; Fernanda Alves de PaivaII; Marcia SaladineVieira SallesIII - mzanetti[arroba]usp.br

IFaculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, (FZEA), Universidade de São Paulo, (USP), rua Duque de Caxias Norte, 225 13630, Pirassununga, SP, Brasil.IIFZEA, USP, Pirassununga, SP, Brasil IIIInstituto de Zootecnia Assis, Assis, SP, Brasil.



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