Aumento da procura de tratamento por usuários de crack em dois ambulatórios na cidade de São Paulo, nos anos de 1990 a 1993

Enviado por S. Formigoni


 

Resumo

Nos últimos anos tem sido observado aumento do uso de crack (uma forma de cocaína fumada) em pesquisas epidemiológicas e em apreensões policiais. Até o presente, não havia dados brasileiros relacionando a procura de tratamento para a dependência de cocaína com as vias habituais de administração

OBJETIVO. Analisar as modificações das vias de administração da cocaína em uma população de 245 pacientes atendidos em dois serviços ambulatoriais especializados (PROAD e UDED), na cidade de São Paulo, entre os anos de 1990 e 1993.
MÉTODOS. Dados de entrevistas padronizadas realizadas na admissão dos pacientes aos serviços foram estudados e determinada a prevalência de uso das diferentes vias de administração de cocaína.
RESULTADOS. A percentagem de pacientes que relataram uso de cocaína fumada (crack) aumentou de 17%, em 1990, para 64%, em 1993 (p<0,01). O uso de cocaína aspirada não variou durante esse período, permanecendo a via mais freqüentemente relatada (80%), enquanto a via endovenosa variou de 40%, em 1990, para 18%, em 1992, e para 28%, em 1993.
CONCLUSÕES. As implicações do aumento de usuários de crack que procuram tratamento são discutidas em função do planejamento de tratamento e de programas de prevenção, com ênfase no risco de transmissão do vírus HIV.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, uma nova forma da cocaína tem-se tornado disponível em nosso meio. Esse produto, denominado crack, é uma forma potente de cocaína que resulta em rápido e notável efeito estimulante quando fumado. A euforia ocorre dez segundos após a inalação, com o pico de concentração plasmática da cocaína atingido entre 5 e 10 minutos após a inalação1,2. Concentrações semelhantes só são atingidas após uma hora da administração intranasal de uma dose equivalente3. O crack é resultado da adição de bicarbonato de sódio e adulterantes ao cloridrato de cocaína ("pó"). Após o aquecimento dessa mistura, obtém-se um resíduo seco que é vendido na forma de pequenas "pedras" que podem ser fumadas em cachimbos, cigarros e outros objetos improvisados. O nome crack provém do barulho que é produzido pela quebra dessas "pedras". Quando fumado, o crack produz pequenas partículas que são absorvidas rapidamente pelos pulmões, conduzindo imediatamente ao aparecimento dos efeitos. A velocidade desse processo parece ser um dos fatores responsáveis pelo seu alto poder de adição4,5.

Um dos aspectos muito importantes no uso do crack é a dimensão dos problemas físicos associados. No trato respiratório, têm sido observados vários problemas como: tosse, expectoração enegrecida, dor peitoral, redução da função pulmonar, com capacidade de expiração comprometida e, em casos mais graves, pneumotórax espontâneo e enfisema no mediastino6. No aparelho cardiovascular, o aumento da freqüência cardíaca e da PA e o notável efeito vasoconstritor podem levar a uma parada cardíaca. Outros efeitos associados ao uso de crack são necrose muscular, problemas neurológicos como convulsões e hemorragias cerebrais, e problemas psiquiátricos como paranóia, depressão severa e ataques de pânico. Alguns estudos detectaram importantes alterações neurológicas nos filhos de usuárias de crack, como retardo no crescimento intra-uterino, menor perímetro cefálico, tremores, irritabilidade, rigidez muscular e convulsões transitórias7.

Nos Estados Unidos, o uso do crack tornou-se popular em meados dos anos 80. Seu desenvolvimento deu-se de forma cíclica durante aquela década, tendo atingido o pico de consumo por volta de 19908. Nesse período, inúmeros trabalhos foram publicados na literatura internacional a respeito do crescimento dessa via de administração da cocaína, dos seus efeitos no organismo, assim como das características particulares dos seus usuários, sua relação com criminalidade9, comportamento sexual e influência no risco de transmissão da AIDS10.

Em revisão publicada recentemente11, observa-se que, no Brasil, a cocaína tem despertado interesse cada vez maior da mídia e dos pesquisadores, nos últimos anos. Em relação ao crack, apesar de indícios do seu consumo crescente, poucos trabalhos têm sido desenvolvidos no sentido de entender esse uso, potencialmente, tão comprometedor. No mais recente levantamento realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas (CEBRID), setor do Departamento de Psicobiologia da EPM, entre estudantes12 e meninos de rua13, parece nítido o aumento do uso de cocaína, em todo o Brasil, com destaque para São Paulo e Rio de Janeiro. O crescimento do uso de crack é muito mais evidente em São Paulo do que nas outras cidades, havendo diferença importante na prevalência do uso dessa droga (cocaína) e das suas formas de administração nas diversas regiões do país. Na Região Nordeste, por exemplo, o uso de cocaína é muito pequeno entre os estudantes.

Tendo em vista a carência de informações sobre o uso de crack no Brasil, este trabalho visou estudar a prevalência de uso de cocaína e suas vias de administração, na população atendida em dois serviços ambulatoriais para tratamento de dependentes de drogas de São Paulo, nos anos de 1990 a 1993.

 


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