Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 

Aplicação de técnicas de fotomodelagem e visualização 3D (página 2)

Gerson Gomes Cunha

 

Introdução

Florenzo et all [1] destacam que a importância do trabalho pericial é destacada não só sob o aspecto da sua caracterização como prova essencial à instrução processual (cível ou criminal), mas também quanto a sua extrema valia no sentido de que, além de orientar programas de prevenção de acidentes, possibilita avaliar o desempenho dos veículos e seus componentes frente à realidade dos acidentes efetivamente ocorridos em contraste com o ambiente de laboratório dos crash tests, como ainda apontar falhas viárias, com inestimável apoio à melhoria da segurança do trânsito.

Neste contexto, o estabelecimento das evidências traduzidas em medições precisas, que fazem da introdução de métodos e técnicas de construção de modelos e da possibilidade de sua visualização tridimensional, uma potente ferramenta de apoio para o trabalho pericial, em oposição aos métodos tradicionais utilizados.

O presente artigo pretende apresentar a aplicação de técnicas de fotomodelagem 3D como forma de contribuição para a eficácia do trabalho pericial em sinistros concernentes a acidentes de trânsito.

O Estabelecimento Das Provas

A palavra prova deriva do latim probare, convencer, tornar crível, estabelecer uma verdade, comprovar [2].

Segundo Florenzo [1], a apuração da responsabilidade decorrente de um acidente de trânsito é da alçada da Justiça, a qual o faz pela instauração de um procedimento legal denominado genericamente de processo.

Os instrumentos que justificam a instauração do processo são as provas, uma vez que são elas que contribuem para formar a convicção1 do julgador acerca de qual (ais) aplicação (ções) da legislação é (são) cabível (íveis) para o fato. Podem ser definidas como todos os meios que permitem à parte demonstrar a existência dos fatos, ou ainda, todo meio lícito empregado pela parte ou interessado na demonstração daquilo que alega.

As provas, segundo o Código P Civil (CPC) [3], são subdivididas em: 1) provas orais, constituindo-se no oral depoimento das partes e das testemunhas (arts. 343 e 410); 2) prova documental: será apresentada com a petição inicial ou com a resposta do réu, aplicandose, quanto a documentos novos, os arts. 396 e 397 e 3) prova pericial: será determinada no saneamento do processo (Art. 331), e produzida antes da audiência de instrução e julgamento (Art. 443). Consiste e em exame, vistoria ou avaliação. Todavia, poderá a parte requerer esclarecimentos ao perito, a serem prestados em audiência (Art. 435). A chamada produção antecipada de provas (CPC, arts. 846 a 851) [5] ocorre dentro de circunstâncias especiais (receio de falecimento de uma testemunha, desaparecimento de vestígios etc.).

O destinatário da prova é o juiz, é para ele que tem-se que demonstrar o fato, reproduzir aos seus olhos o que ocorreu no passado, utilizando todos os meios permitidos em direito.

Não se pode, todavia, desconsiderar o aspecto subjetivo da definição, qual seja, o da convicção do próprio juiz. Daí definirmos a prova processual como todo meio lícito e suscetível de convencer o juiz da verdade de uma alegação da parte. A prova judicial reveste-se de um conteúdo finalístico marcante, qual seja, o convencimento do juiz Por outro lado, se o juiz deve decidir, unicamente, com fundamento nas provas apresentadas pelas partes, nada obsta que o magistrado, em caso de obscuridade ou incompletude das provas, busque a verdade de ofício, ouvindo terceiros mencionados por aquelas.

Em qualquer caso, como assinala Roberto Barcellos Magalhães, para que a prova frutifique é imperioso que seja suficiente (plena); seja clara e não incerta, obscura ou duvidosa; concludente e não impertinente ou irrelevante; e oportuna, ou seja, produzida no momento processual adequado [4]. Tais afirmações concluem que a prova é tão importante para o processo que, sem ela, este não poderia subsistir: qui probare non potest nihil habet (quem não pode provar nada tem). Tais provas são qualificadas de ad perpetuam rei memoriam, porque se destinam a preservar a veracidade de uma afirmação ou fato. O requerente justificará sumariamente a necessidade da antecipação e mencionará com precisão os fatos sobre os quais há de recair a prova (Art. 848, caput) [5].

Fotomodelagem

A fotomodelagem é um processo computadorizado que, apartir de fotografias e utilizando a Fotogrametria - ciência de extrair medidas de fotografias - , é capaz de gerar um modelo tridimensional texturizado, possibilitanto a realização de medições e extração de dados.

O Processo - Descrição

Através de pontos de referência indicados nas imagens (mesmos pontos de um objeto ou cena, em imagens feitas de ângulos diferentes), ver (figura 1); um programa de fotomodelagem extrai a posição da câmera, em cada fotografia (figura 2). A partir da interseção dos "raios" que passam pela câmera assim como pelos pontos em cada foto, o programa calcula a posição destes em um espaço tridimensional, e através de sua união, "cria" o objeto (figura 3). Conhecendo-se previamente alguns pontos na fotografia, este cálculo pode ser feito com o uso de uma única foto. Normalmente, utilizam-se duas ou mais fotografias para se modelar um objeto ou cena por completo (figura 4).

1 Art. 131 - O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas, deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

I Workshop de Realidade Virtual e Visualização Científica do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia – LAMCE / PEC / COPPE / UFRJ 27, 28 e 29 de novembro de 2002 – http://www.lamce.ufrj.br/GRVa/wrv2002

Figura 1 Figura 2 Figura 3 Figura 4 Fonte: www.photomodeler.com

Uma vez extraido o modelo tridimensional texturizado, é possível manipulá-lo, visualizando-o de diversos ângulos diferentes, retirando medidas e informações, com auxílio do próprio programa de fotomodelagem ou de um programa de visualização de modelos 3D que entenda um dos formatos exportados pelo programa de fotomodelagem (ex.: vrml).

A vantagem do processo de fotomodelagem é que, para se obter um objeto ou cena/ambiente tridimensional de outra maneira, tornase necessário criar manualmente tal objeto ou cena, com o auxílio de um programa de desenho 3D e outro de tratamento de imagens, aplicando as medidas e texturas previamente extraídas - e processadas - das fotografias. Este é justamente o processo automatizado pelo programa de fotomodelagem. Portanto, ele não nos disponibiliza apenas estruturas 3D, mas também texturas planificadas que podem ser usadas em outros modelos (um exemplo seria a extração de uma linha de horizonte com céu para aplicação em um "mundo-RV"). Devemos considerar também que em alguns casos, torna-se impossível extrair medidas manualmente a partir de imagens.

O Processo - Cuidados

Todas as informações necessárias deverão estar presentes nas imagens, portanto a realização destas deverá obedecer a certos critérios: • Fotografias a serem utilizadas em um processo de fotomodelagem devem ser realizadas mantendo-se constante a distância focal da objetiva, o que significa que, se a câmera utilizada dispõe de uma distância focal variável (zoom), deverá se escolher uma única medida para todo o conjunto de fotos das quais será extraido o modelo 3D. Isto se tornará importante no momento em que o programa de fotomodelagem estiver extraindo das fotografias as informações de que necessita.

• Caso as fotografias tenham sido tiradas com câmera tradicional (película), o filme deve ser escolhido de acordo com a resolução desejada – tamanho do negativo e grão – e a imagem deve ser digitalizada de forma que possa ser manipulada no(s) programa(s). Tanto no caso da digitalização via scanner quanto no caso de fotografia com câmera digital, deve-se estar atento à resolução aplicada à imagem, uma vez que a qualidade da textura e do processo como um todo dependerá também deste fator. No caso de fotografias tradicionais com película, indica-se o uso de filme diapositivo e digitalização com scanner a laser.

• As fotografias tem que ser tiradas de forma que o eixo de uma imagem forme um ângulo de noventa graus ou menos com a sua justaposta, uma vez que os pontos referenciais tem que estar presentes em duas imagens (vide figura 4, acima) • Podem ser feitas imagens de detalhes de interesse especial, que serão por sua vez processadas formando um outro objeto 3D.

• Aconselha-se o uso de tripé para a execução das fotografias, principalmente quando a situação oferece pouca luminosidade.

A Fotomodelagem e o Trabalho Pericial

Para o campo pericial a fotomodelagem torna-se uma ferramenta muito útil, uma vez que, realizadas as fotografias da cena do sinistro, de acordo com as normas necessárias para uma boa extração de modelo 3D, não há mais necessidade de preservação desta cena. O perito tem como material de análise, além das fotografias, a possibilidade de reconstrução da cena em 3D, permitindo-lhe inclusive a imersão, ou seja, penetrar na cena e interagir com ela, fazendo medições e extraindo dados que de outra forma tornar-seiam mais herméticos.

Obviamente a ferramenta ou programa utilizado deverá contemplar a possibilidade de execução de medições e análises mais complexas. Existem no mercado, hoje, ferramentas que permitem a medição sub-pixel, ou seja, o ponto de medição pode estar dentro dos limites de um pixel, não sendo este um limitador, funcionando como uma unidade mínima. Na prática isto pode permitir que medidas sejam tiradas em imagens que não apresentem uma resolução tão boa, o que pode ocorrer, por exemplo, no caso de uma testemunha fornecer alguma fotografia do local do acidente e esta não se enquadrar no padrão de otimização.

Sem dúvida alguma, como prova (de convencimento), no caso, para um juiz, a possibilidade deste interagir com a cena é um grande avanço em matéria de sustentação de um caso.

No caso de acidentes com veículos, a possibilidade de comparação entre um veículo acidentado e um de mesma marca e modelo intacto (figura 5) permite ainda que se chegue a diversas conclusões, principalmente se o fabricante disponibilizar dados sobre a fabricação daquele modelo, como, por exemplo, a resistência do material utilizado na confecção das partes danificadas no sinistro.

Estes dados podem resultar, no trabalho pericial, em conclusões como velocidade na hora da colisão, direção em que o veículo trafegava, entre outros; no trabalho de projeto dos veículos, pode render alterações estruturais que tragam mais segurança e conforto para seus usuários.

I Workshop de Realidade Virtual e Visualização Científica do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia – LAMCE / PEC / COPPE / UFRJ 27, 28 e 29 de novembro de 2002 – http://www.lamce.ufrj.br/GRVa/wrv2002 Figura 5 Fonte: www.photomodeler.com Conclusões

Demonstramos como a fotogrametria associada aos métodos de visualização tridimensionais torna-se aliada valiosa dos peritos, assim como dos demais agentes envolvidos em um caso onde é imprescindível determinar, com precisão, valores que só poderiam ser medido in loco.

A utilização de técnicas de fotogrametria na perícia pode não só auxiliar na análise do sinistro tanto na definição de suas causas como na avaliação dos dados e extração de informações adicionais de levantamentos com registros antigos onde as fotografia não foram tiradas com a finalidade de fotomodelagem.

A fotogrametria associada a técnicas de visualização tridimensional, possibilita ainda que os perítos transmitam de forma clara e de fácil entendimento, suas conclusões ao público leigo em geral.

Um dos fatores que normalmente são restritivos na implantação e adoção de novas técnicas no Brasil, são os custos envolvidos.

Isso no entanto, não é o caso da fotomodelagem e visualização tridimensional, pois existem diversas ferramentas de baixo custo (inclusive de graça) disponíveis no mercado e os equipamentos podem ser adotados de forma modular, crescendo em complexidade e preço, conforme a necessidade.

Referências Bibliográficas

[1] Florenzo V; Ventura Filho RM. A Importância da Perícia na Investigação de Acidentes de Trânsito. Dynamics - Bureau de Perícias de Acidente de Trânsito, 2002. http://www.laboratoriosegurancaviaria.com.br/legis_per_cinto.htm

[2] Dji Bibliografia. http://www.dji.com.br/processo_civil/provas.htm#Provas .

[3] Provas - Arts. 332 a 443, Provas - Procedimento ordinário - Processo de conhecimento - Código de processo civil - L-005.869- 1973 - Prova penal (http://www.dji.com.br/processo_civil/provas.htm#Provas )

[4] Dicionário Jurídico e Repertório Processual, Rio de Janeiro, Editora Didática e Científica Ltda., 3º v.)

[5] Código de processo civil - L-005.869-1973, Livro I, Do Processo de conhecimento, Título IV; Dos Órgãos judiciários e dos auxiliares da justiça; ;Capítulo IV Do Juiz; Seção I Dos Poderes, dos deveres e da responsabilidade do juiz (http://www.dji.com.br/codigos/1973_lei_005869_cpc/cpc0125a0133.htm#Art.%20130 )

[6] Banco de Informações Utilitárias. Acidentes de Trânsito, Como Agir. http://www.bdb.org.br/util_pub/acidentes_tran.htm .

[7] Photomodeler - http://www.photomodeler.com .

[8] Realviz ImageModeler – http://www.realviz.com .

[9] Geometra 3D – http://www.geometra-3d.com .

[10] Photo3D – http://www.photo3d.com .

I Workshop de Realidade Virtual e Visualização Científica do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia – LAMCE / PEC / COPPE / UFRJ 27, 28 e 29 de novembro de 2002 – http://www.lamce.ufrj.br/GRVa/wrv2002

ANEXO

Acidentes de Trânsito com Vítimas: Procedimentos e Implicações No caso de ocorrer acidente de trânsito sem vítimas, não há obrigatoriedade da realização da perícia técnica. Nos casos de acidentes com vítimas, entretanto, os procedimentos abaixo são indicados (Banco de Informações Utilitárias [6]):

• a perícia é obrigatória.

• Caso a vítima tenha condições físicas, deve ligar para a Polícia Militar, Corpo de Bombeiros ou Detran. Estes se encarregarão de acionar a Polícia Civil, que vai instaurar o inquérito e apontar os culpados pelo acidente.

• Os veículos devem permanecer no mesmo local - a não ser que a autoridade policial determine a sua retirada. Alguns cuidados, no entanto, devem ser tomados, como colocar triângulo de advertência e acender a luz de alerta do carro.

• O envolvido é obrigado a prestar socorro à vítima do outro carro, sob risco de cumprir pena de dois a quatro anos de prisão e ser suspenso ou proibido de dirigir. O Socorro médico, todavia, somente deverá ser prestado por profissional competente.

Nesse caso, prestar socorro significa chamar os órgãos apropriados.

Como Agir na Justiça • Quando a colisão for pequena e o conserto do veículo não ultrapassar 40 salários mínimos (R$ 7.200), o caso será levado aos juizados especiais cíveis. Danos de até 20 salários mínimos (R$ 3.600) não exigem intervenção de advogado.

• Quando o acidente resulta em vítimas, a Polícia Civil necessariamente instaura processo criminal para apurar as responsabilidades. Paralelamente, o motorista que se sentiu prejudicado pode entrar com ação indenizatória na Justiça comum.

• No dia da audiência, cada um dos envolvidos na colisão deve apresentar três orçamentos para o conserto do veículo. Após o julgamento, o motorista apontado como o provocador do acidente colocará o carro da vítima na oficina que apresentou o menor orçamento.

• Se um dos motoristas não comparecer à audiência na data marcada, o caso será julgado à revelia. O faltoso será executado judicialmente e obrigado a pagar o conserto do outro carro. Se ele insistir em não quitar a dívida, terá os bens penhorados, no valor do conserto.

Algumas Penalidades Previstas (Banco De Informações Utilitárias [6]): • Negar-se a retirar o veículo da via, quando determinado por autoridade policial. Falta média, cinco pontos na carteira de habilitação e multa de R$ 80,00.

• Não prestar socorro a vítimas quando você está envolvido no acidente. Infração gravíssima, sete pontos na carteira e multiplicação do valor padrão da multa (R$191) por cinco (R$ 955).

• Negar socorro a vítima, quando solicitado por autoridade, mesmo que você não esteja envolvido no acidente. Infração grave, cinco pontos na carteira e multa de R$ 127).

Elomar Christina Vieira Castilho Barilli (1); Isis Braga (2), Luiz Antônio; Fernandes Braga (3); Paula Faragó (4); Gerson Gomes Cunha (5)
Isisbr[arroba]Openlink.Com.Br

1. Escola Nacional de Saúde Pública / Fiocruz – barilli[arroba]ead.ensp.fiocruz.br
2. Escola de Belas Artes / UFRJ –
isis[arroba]eba.ufrj.br
3. Escola de Belas Artes / UFRJ –
luiz[arroba]eba.ufrj.br
4. Programa de Engenharia Civil / COPPE / UFRJ –
farago[arroba]lamce.ufrj.br
5. Programa de Engenharia Civil / COPPE / UFRJ – gerson[arroba]lamce.ufrj.br



 Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.