A interpretação de peças de música de outras épocas é uma mimese contemporânea, posto que o distanciamento histórico, os problemas técnicos e as transformações ambientais inviabilizam a reprodução da obra como teria sido em sua origem. O pensamento retórico e a religiosidade são alguns dos fatores que interferem na leitura da música colonial.
A caverna em que habito fica numa região em que há muitas outras. Passei nela uma madrugada acordado, tentando ouvir o silêncio da noite – nem havia estrelas. As outras pessoas que vivem comigo não produziam nenhum ruído, provavelmente dormissem...
Mas o que menos pude ouvir foi o silêncio. Não havia nenhum fogo em minha espelunca, mas várias luzes penetravam pelas frestas, nenhuma delas natural. Mas havia ruídos das cavernas adjacentes, de todos os lados, das pessoas transitando entre elas, e dos fogos sempre acesos em algumas delas, de animais... Nunca há silêncio, quando há tantas cavernas.
Do silêncio da noite, aquele que nos permite ouvir a voz das estrelas, só pude ter a saudade de algum dia bem distante quando estive em lugar bem menos habitado, lugar em que o fogo mais perto, em linha reta, teria viajado alguns anos antes de chegar a mim. E os ruídos eram das folhas, dos insetos, o ar se movimentando... Sons que não se sobrepõem ao éter ou ao atrito da atmosfera com o planeta em seu giro diário.
Fiquei imaginando qual seria, há 200 anos, o som da noite no lugar mesmo em que nasci... Quando ali haveria poucas cavernas e a centésima parte das pessoas dentre as quais eu vivo. E muito poucos lumes e candeias competiam com a radiação dos astros.
Públio Athayde
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