Sociologia Marilena cHAUI A NAO VIOLENCIA DO BRASILEIRO

8094 palavras 33 páginas
Marilena Chauí

A NÃO VIOLÊNCIA DO BRASILEIRO,
UM MITO INTERESSANTÍSSIMO. *

Nosso céu tem mais estrelas, nossos bosques têm mais flores, somos, graças a Deus, gente ordeira e pacífica. Nós, brasileiros, não temos horror à violência...Quantas vezes, dos palanques de comício, pelas ondas de rádio e pelos canais de televisão, ouvimos o refrão? A classe dominante, assistida por seus intelectuais, construiu a imagem do brasileiro como povo não violento.
Mito interessantíssimo porque, se nos interessa perceber quais os dispositivos ideológicos que permitem sua construção, a despeito (ou por causa?) da realidade brutal dos fatos. Aliás, o próprio refrão – somos gente que odeia violência – sugere que a dissimulação da realidade se
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Os especialistas atribuem o atual “surto” de violênciaao anacronismo do Judiciário, que se encontra despreparado para enfrentar uma situação histórica nova (o desenvolvimento industrial), situação esta descrita a

partir de conceitos da sociologia durkheiniana, em particular, o conceito de anomia. Em outras palavras, a situação atual é apresentada como favorável à criminalidade e à transgressão porque as regras, normas e leis das relações sociais.Assim, migração, urbanização desenfreada, miséria, proletarização do homem do campo, marginalização social e política, excessiva concentração da riqueza e perecimento dos laços tradicionais de existência comunitária seriam as causas da atual violência no país, sendo também compreensível que as camadas mais violentas sejam as mais miseráveis. Em uma palavra, na passagem do “tradicional” para o “moderno”as desigualdades socioeconômicas aumentaram e a violência é uma resposta circunstancial à situação de disfunção social causada por essa transição. Não cabe, aqui, analisar os conceitos sociológicos empregados. Basta apenas assinalar o que eles permitem fazer. Como efeito, a violência esta sendo tratada como uma reação de baixo para cima (portanto, como violação) como acidental ou ocasional (isto é, como fruto inesperado do descompasso entre as leis e costumes), como circunscrita à esfera da criminalidade (isto é, como transgressão do direito de propriedade e de vida) e como a ação perpetrada pelos

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